Rio de Janeiro. 1998.
Embora Katharine Hepburn tivesse feito grandes papéis, nada poderia se comparar a Mary Tyrone (Longa Jornada Noite Adentro) em complexidade psicológica, exigência física e emocional e dimensão trágica. Durante os três primeiros dias de ensaio eu não disse coisas alguma a ela sobre a personagem de Mary Tyrone. Conversei muito com Jason, que fizera seu papel antes, com Ralph e Dean e naturalmente falamos da peça. Quando acabamos a leitura geral no terceiro dia, houve uma longa pausa. E então, do canto da mesa onde Kate estava, uma voz fraquinha disse: "Socorro!"
A partir daí o trabalho foi emocionante. Ela perguntava, falava, queixava-se, tentava, fracassava, acertava. Construía aquela personagem pedra a pedra. Faltava ainda alguma coisa à interpretação no final da segunda semana. Há um momento no roteiro em que seu filho mais novo, tentando romper o atordoamento em que a deixava a morfina, diz a ela aos gritos que ele está morrendo. Eu disse: "Kate, eu gostaria que você lhe aplicasse um tapa com toda a força possível." Ela começou a dizer que não podia fazer aquilo, mas a frase foi morrendo em sua boca. Pensou nisso durante uns trinta segundos depois disse: "Vamos tentar." E bateu nele. Olhou para a cara chocada de Dean e seus ombros começaram a tremer. Afundou-se na prostração amedrontada que era um aspecto tão importante de Mary Tyrone. A visão daquela Hepburn colossal em tal estado era a personificação da representação trágica. Quando os gregos diziam que a tragédia é para a realeza, estavam apenas dizendo que a tragédia era para gigantes. Não houve mais represamento. Kate estava em ascensão.
Fazendo filmes, Sidney Lumet, p. 70
A partir daí o trabalho foi emocionante. Ela perguntava, falava, queixava-se, tentava, fracassava, acertava. Construía aquela personagem pedra a pedra. Faltava ainda alguma coisa à interpretação no final da segunda semana. Há um momento no roteiro em que seu filho mais novo, tentando romper o atordoamento em que a deixava a morfina, diz a ela aos gritos que ele está morrendo. Eu disse: "Kate, eu gostaria que você lhe aplicasse um tapa com toda a força possível." Ela começou a dizer que não podia fazer aquilo, mas a frase foi morrendo em sua boca. Pensou nisso durante uns trinta segundos depois disse: "Vamos tentar." E bateu nele. Olhou para a cara chocada de Dean e seus ombros começaram a tremer. Afundou-se na prostração amedrontada que era um aspecto tão importante de Mary Tyrone. A visão daquela Hepburn colossal em tal estado era a personificação da representação trágica. Quando os gregos diziam que a tragédia é para a realeza, estavam apenas dizendo que a tragédia era para gigantes. Não houve mais represamento. Kate estava em ascensão.
Fazendo filmes, Sidney Lumet, p. 70
2 comments:
Olá, talvez você goste do que eu escrevi para todos nós. Beijos, E-Miller.
www.cigarrosedrops.blogger.com.br
Olá Eduardo.
Venho procurando este livro do Sidney Lumet e uma pesquisa no google me trouxe até seu blog. Aqui no Rio de Janeiro ele está esgotado. Será que você sabe me indicar alguma livraria ai de são paulo que ainda o tenha?!
Grata.
tyssasouza@gmail.com
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